Neste post quero apresentar como foi minha jornada na construção da minha startup e o meu sonho de se tornar um empreendedor, e sobre o desenvolvimento de produtos e lançamento no mercado, em minha área de atuação que é a engenharia eletrônica.
Existem muitos livros e referências sobre como criar uma empresa de sucesso, muitos mostram como montar uma Startup, como começar uma empresa com pouco dinheiro e ganhar muito dinheiro, e muitos livros mostram como outras empresas fizeram muito dinheiro oferecendo serviços como entregas, locomoção, aluguel, ou venda de produtos sem ter nenhuma moto, sem ter nenhum carro e nenhuma casa, apenas desenvolvendo um sistema que facilita o acesso a esses recursos.
Entretanto nem todos os livros apresentam o processo e as dificuldades pelas quais a empresa passou no inicio da sua jornada, e também não mostram como foi o processo de crescimento e desenvolvimento do negócio, apresentam apenas os resultados finais.
Quando iniciei a minha jornada na Wantronics, motivado por histórias de empreendedorismo e com vontade de ganhar muito dinheiro, peguei todo o dinheiro da minha rescisão trabalhista em 2014 e resolvi investir em um lote de placas de circuito impresso que desenvolvi.
O produto que eu havia desenvolvido utilizava um microcontrolador PIC16F628A, alguns resistores, quatro relés, e uma porta para comunicação serial RS232, com o objetivo de tornar a automação residencial e de máquinas mais fácil, além de oferecer uma solução mais barata, de forma a substituir os relés lógicos programáveis comerciais, eu chamei o meu produto de CLP PIC Wantronics.
Diferença entre produto mínimo viável e protótipo
Nos livros sobre empreendedorismo e startups existe uma estratégia que consiste em se desenvolver um produto mínimo viável, é importante diferencia um produto mínimo viável de um protótipo.
O produto mínimo viável é um produto que funciona, ou que apresenta o mínimo necessário para resolver o problema do cliente, por exemplo, vamos supor que um cliente precise de um circuito que faça a leitura de um sensor de temperatura e se a temperatura ficar acima de 30 ºC, o circuito precisa acionar um ventilador. Para desenvolver esse produto mínimo viável o ideal é fazer um projeto de uma placa de circuito impresso, com um microcontrolador, usar um sensor de temperatura com uma boa precisão, dimensionar o circuito de saída, por exemplo, usar um transistor para acionar um relé de saída, e com um circuito snubber ligado aos contatos do relé, para evitar que os contatos do relé se fundam e fiquem colados, acionem o ventilador.
Com o produto mínimo viável se faz um levantamento de todo os custos envolvidos, adiciona uma margem de lucro ao produto e tenta vender, caso esse produto seja um produto físico. Caso o produto não tenha vendas no mercado isso significa que necessário pivotar, ou seja, abandonar esse produto e desenvolver um novo produto.
Já um protótipo seria uma fase anterior ao produto mínimo viável, seria a etapa onde seriam feitas simulações de circuitos, montagens provisórias afim de validar o funcionamento dos circuitos, e serão desenvolvidos firmwares para validar a aplicação final.
O CLP PIC Wantronics poderia ser considerado o começo de um produto mínimo viável, pois poderia ser instalado em painéis elétricos e tinha capacidade de fazer uma série de funções.
A empresa
A Wantronics iniciou suas atividades vendendo micro CLP PIC com microcontroladores PIC16F628A, o modelo apresentado na figura acima. Depois disso, surgiram algumas dúvidas no plano de negócio e era, ter uma empresa para desenvolvimento de projetos eletrônicos, ou uma empresa que vende os seus produtos eletrônicos?
Vendendo produtos
A primeira coisa que um empreendedor precisa fazer é um plano de negócios para avaliar a viabilidade de seu negócio, e definir qual atividade, ou em quais mercados a empresa vai atuar.
Se o empreendedor optar por desenvolver um produto, ele precisa definir onde vender, preço de venda, custos de produção e demais despesas, como vida útil das ferramentas.
Quando fiz as primeiras unidades do CLP PIC Wantronics, eu havia estimado um valor para venda e considerado um margem de lucro, considerando um cenário que vendendo uma determinada quantidade placas mensais eu poderia me manter financeiramente e reinvestir parte do lucro na crescimento da minha empresa.
Para vender as placas utilizei ferramentas de marketplace, entretanto o preço que eu havia estabelecido inicialmente, segundo comentários de possíveis compradores estava muito elevado, e para o tipo de placa que eu estava vendendo não se caracterizava como um CLP. Após reduzir bem o preço daí consegui vender o meu primeiro lote de 50 placas.
A vantagem da venda no marketplace foi que me possibilitou vender de uma forma bem mais fácil, e também me levou a conhecer novos clientes, e com isso foram solicitados o desenvolvimento de novas placas de circuito impresso.
Depois do CLP PIC Wantronics, eu havia desenvolvido outra versão com uma quantidade maior de relés, com uma quantidade maior de entradas, com comunicação serial RS232 e com um display LCD 1602. Essa versão de placa fiz apenas algumas unidades, em torno de 25 placas, o preço era maior, pois utilizavam componentes com um custo maior.
Depois fiz desenvolvimentos de outras placas, como shields com 8 relés para ser utilizados com microcontroladores.
Serviços
Eu pensei em criar uma empresa que ofereceria a prestação de serviços na área de desenvolvimento de projetos eletrônicos, desenvolvimento de hardware, firmware e software. O problema é que para desenvolver um produto completo com todas as esses recursos leva muito tempo se for executado por apenas uma pessoa. Quando se tralha com uma equipe bem preparada o tempo se torna menor, mas o custo se torna elevado. Vamos passar rapidamente por cada etapa do desenvolvimento de um produto completo, com hardware, firmware e um software para comunicação.
Definindo os requisitos
A primeira etapa é definir os requisitos do produto, e além disso precisamos saber se o mesmo será submetido a algum tipo de teste, certificação, se um produto doméstico que vai na tomada, se é um produto hospitalar, em qual ambiente o produto vai operar detre outras características.
Projeto eletrônicos
Na etapa do projeto eletrônico serão escolhidos os componentes, como transistores, resistores, reguladores de tensão, circuitos integrados. Nesta etapa, a partir dos requisitos serão projetos os circuitos eletrônicos, serão feitas as escolhas dos componentes e serão feitos simulações e montagens de protótipos para validar o funcionamento do circuito.
Exemplo de um projeto eletrônico:
Projeto do Hardware
O projeto do hardware é feito após a conclusão, definição e validação de todos os circuitos. O projeto do hardware eu vou considerar como sendo a parte onde se tem um esquemático definido, e a partir desse esquemático podemos fazer o layout da nossa placa de circuito impresso.
Nessa parte também podemos nos deparar com os seguintes problemas que devemos resolver durante o desenvolvimento:
- Desenhar símbolos para componentes inexistentes na biblioteca do software EDA que estamos usando para desenvolver o nosso hardware;
- Desenhar o footprint para componentes inexistentes na biblioteca do software EDA que estamos usando para desenvolver o nosso hardware;
- Desenhar modelos 3D, caso não encontremos os mesmos em websites especializados;
É preciso ficar atento pois fazer o layout de uma placa de circuito impresso não é apenas posicionar os componentes em posições aleatórias e fazer trilhas de qualquer forma, é preciso tomar cuidado com vários detalhes que podem fazer com que o seu projeto não funcione, ou nem seja aprovado nas fases de certificação do produto.
Exemplo de projeto eletrônico:
Projeto do firmware
O projeto do firmware pode ser feito de forma concomitante ao desenvolvimento do hardware, desde que exista uma equipe. Caso seja apenas uma pessoa, então o desenvolvimento tem que ser feito após a conclusão do design do hardware, usando os protótipos e Dev Borads para isso.
O projeto do firmware também é uma etapa importante, uma vez que é possível escrever códigos que executam as mesmas tarefas, mas usando comandos diferentes. Isso é algo que precisamos estar atentos, pois existem detalhes que devem ser considerados, como uso de memória, esforço de processamento, detre outros detalhes que podem ser a diferença entre um bom projeto eletrônico e um projeto que apenas funciona.
Além disso, dependendo do equipamento que se está projetando, como por exemplo, no setor automotivo existem regras e padrões que devem ser seguidos quando escrevemos código em linguagem C, consultem por exemplo o padrão MIRSA – C.
Abaixo é apresentado um exemplo de firmware em Linguagem C.
/*
* File: CLP_Wantronics.c
* Author: wandery
*
* Created on 2 de Maio de 2021, 19:58
*/
// PIC16F628A Configuration Bit Settings
// 'C' source line config statements
// CONFIG
#pragma config FOSC = HS // Oscillator Selection bits (HS oscillator: High-speed crystal/resonator on RA6/OSC2/CLKOUT and RA7/OSC1/CLKIN)
#pragma config WDTE = OFF // Watchdog Timer Enable bit (WDT disabled)
#pragma config PWRTE = ON // Power-up Timer Enable bit (PWRT enabled)
#pragma config MCLRE = ON // RA5/MCLR/VPP Pin Function Select bit (RA5/MCLR/VPP pin function is MCLR)
#pragma config BOREN = ON // Brown-out Detect Enable bit (BOD enabled)
#pragma config LVP = ON // Low-Voltage Programming Enable bit (RB4/PGM pin has PGM function, low-voltage programming enabled)
#pragma config CPD = ON // Data EE Memory Code Protection bit (Data memory code-protected)
#pragma config CP = ON // Flash Program Memory Code Protection bit (0000h to 07FFh code-protected)
// #pragma config statements should precede project file includes.
// Use project enums instead of #define for ON and OFF.
#include <xc.h>
#define _XTAL_FREQ 4000000 //Define a frequência do cristal oscilador
void main(void) {
int rele[6]; // Variável para mudar o estado dos relés
const int tempo = 250; // Varíavel para filtro das entradas
CMCON = 0x07; // Desliga os comparadores de tensão
TRISA = 0x00;
TRISB = 0x3F;
PORTA = 0x00; // Desliga todos os relés
PORTBbits.RB7 = 0; // Desliga o relé 4
for (int i = 0; i < 6; i++) {
rele[i] = 0;
}
while (1){
PORTAbits.RA4 = rele[0];
PORTAbits.RA3 = rele[1];
PORTAbits.RA2 = rele[2];
PORTBbits.RB7 = rele[3];
PORTAbits.RA0 = rele[4];
PORTAbits.RA1 = rele[5];
if (PORTBbits.RB0 == 1) {
rele[0] =~ rele[0];
__delay_ms (tempo);
}
if (PORTBbits.RB1 == 1) {
while (PORTBbits.RB1);
rele[1] =~ rele[1];
__delay_ms (tempo);
}
if (PORTBbits.RB2 == 1) {
rele[2] =~ rele[2];
while (PORTBbits.RB2);
__delay_ms (tempo);
}
if (PORTBbits.RB3 == 1) {
rele[3] =~ rele[3];
__delay_ms (tempo);
}
if (PORTBbits.RB5 == 1) {
rele[4] =~ rele[4];
__delay_ms (tempo);
}
if (PORTBbits.RB4 == 1) {
rele[5] =~ rele[5];
__delay_ms (tempo);
}
}
}
Projeto do software
O projeto do software depende muito do produto, alguns produtos podem ter um software para tornar o produto mais elegante e agregar mais valor, ou podem ser um requisito, como por exemplo, um sistema que precisa controlar uma máquina a 1km de distância que está conectada na internet.
Abaixo é mostrado um exemplo de um software desenvolvido em C# que faz a comunicação com CLP PIC Wantronics.
Problemas de uma startup
Acima foram expostos os desafios, um pouco do modelo de negócio que eu acreditava que seria viável para mim, e que tornaria a minha startup uma empresa sustentável. Agora vou comentar um pouco sobre alguns problemas.
Os produtos
Algum produto seu pode apresentar algum problema que não foi visto ou previsto durante o desenvolvimento, ou alguma situação que não foi imaginada. Imagine se depois de pronto um lote de 1000 peças, se descobre que pela falta de apenas alguns componentes, toda vez que o circuito é energizado, um regulador de tensão vai se degradando, e depois de 10 vezes que o aparelho é ligado / desligado a fonte de alimentação do equipamento queima. Agora imagina que essas 1000 peças já foram enviadas para todo o Brasil, será necessário refazer todas as placas e substituir as que estão em operação, isso pode fazer uma empresa pequena quebrar.
Os clientes
Todos nós queremos ter o menor custo possível para obter o maior lucro, e para isso muitos clientes fazem solicitações ou comentários como:
- Preciso de uma solução de baixo custo;
- Isso é bem fácil de fazer, então não deve ser caro;
- Eu preciso dessa solução o mais rápido possível e precisa de ser de baixo custo;
- Eu vi um vídeo na internet e é bem fácil de fazer, e assim vai.
Entretanto, como foi exposto acima, desenvolver um produto não é uma tarefa fácil ou trivial, e caso fosse os clientes não procuraria uma empresa ou pessoa para fazer esse trabalho para elas.
Além disso, é preciso ter em mente que um profissional que trabalha nessa área investiu e ainda investe muito tempo e dinheiro para dominar e para projetar um produto, e para se manter atualizado.
Conclusão
Para concluir é muito desafiador montar uma startup, ainda mais sozinho, não obter resultados e não conseguir fazer a empresa crescer é um pouco frustrante. Existem outros problemas e desafios, como clientes inadimplentes, clientes que fazem uma solicitação de produção e depois cancelam, e tudo isso faz parte.
É muito importante quando se está começando estudar muito, estude sobre o core do seu negócio, por exemplo, se for uma empresa como a que eu idealizei, estude como desenvolver projetos eletrônicos, como escrever firmwares em linguagem C, em assembly, estude sobre componentes eletrônicos, mas também estude sobre empreendedorismo, busque os cursos do Sebrae, conheça sobre os direitos dos consumidores, e estude um pouco sobre direito, pois existem situações muito delicadas onde você é vítima, mas você pode se tornar o vilão da história e sair no prejuízo, então é preciso ter muito cuidado.
Existem casos de pessoas que conseguem um bom um lucro, que conseguem viver empreendendo, pagando todos os impostos, fazendo tudo certinho e conseguem até contratar pessoas, isso é muito legal. A ideia não desmotivar e sim motivar, e se seguir o caminho certo com certeza vai ter sucesso, mas não se esqueça é preciso trabalhar muito, isso é tudo pessoal e até o próximo post!